Ao passar na Mouraria
(com a música da canção popular «Ao passar a ribeirinha» e de «Quatro quadras soltas» de Sérgio Godinho)
letra escrita numa oficina de canções na Casa da Achada
Junho de 2018
Ao passar na Mouraria
Tropecei num sarraceno
Não era trigo nem joio
Era o meu irmão moreno
Donde vens tu ó amigo?
Venho de longa jornada
Não tenho papéis nem visto
Amanhã não faço nada...
Mas sou quase teu vizinho
E moro num pardieiro
Sem papéis e sem pilim
Nem cama de corpo inteiro
À falta de papelada
Diz a lei dos burocratas
Se o gajo vem das Arábias
Só merece um vão der escadas
Não sou pedra nem calhau
Posso andar para mudar
O meu lugar
Para mudar o meu lugar
Para mudar
(continua com a música das «Quatro quadras soltas»)
E por não ter documentos
Fui ao SEF e pus-me à espera
Mas faltava-me uma carta
E o carimbo que não dera
Então fui recambiado
Sem emprego nada feito
E para arranjar trabalho
Procuro papel de jeito
Se lá eras engenheiro
Cá serás pá de pedreiro
Eu não sei donde tu vens
Mas és mais que os teus papéis
Dão-lhe biscates nas obras
Ao negro e sem regalias
Come merda se houver sobras
Nos bairros com moradias
No Largo de São Domingos
Caminhava rente às casas
Entre vapores e pingos
Como pássaro sem asas
Há quem o olhe de lado
Julgando que é do daesh
Se foste colonizado
Pagas caro e sempre em cash
Não sou pedra nem calhau
Posso andar para mudar
O meu lugar
Para mudar o meu lugar
Para mudar